Museu do Tribunal de Contas da União
Min Ernani do Amaral Peixoto (1961-1966)
O ministro Ernâni Amaral Peixoto nasceu no dia 14 de julho de 1905 na cidade do Rio de Janeiro. Filho de Augusto do Amaral Peixoto e Alice Monteiro do Amaral Peixoto, herdou de seu pai – um ex-combatente da Revolta da Armada – o interesse pelas forças armadas, influenciando-o a construir uma destacada carreira na Marinha antes de se tornar um importante político e ministro do Tribunal de Contas.
Realizou seus estudos primários no Grupo Escolar Tiradentes, em sua cidade natal, e em seguida os estudos secundários no colégio Santo Inácio, em Nova Friburgo (RJ). Aos 18 anos ingressou na Escola de Guerra Naval e mais tarde no curso de armamento da Marinha. Concluiu seu curso em 1924 e nesse mesmo ano começou a se envolver nos movimentos revoltosos que culminaram com a deflagração da Revolução de 1930. Em 1928 formou-se engenheiro geógrafo pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro.
No início da década de 1930, tornou-se membro do Clube 3 de Outubro, importante associação fundada após a articulação do movimento político militar que depôs o presidente Washington Luís e conduziu Getúlio Vargas à presidência da República em 1930.
Nesse período, Peixoto estava na Itália em visita técnica à Marinha italiana quando tomou conhecimento de um movimento de resistência ao novo governo que eclodia em São Paulo, conhecido como a Revolução Constitucionalista de 1932. Imediatamente, retornou ao Brasil e se alistou como voluntário para combater as forças de oposição ao governo provisório, tendo atuado como artilheiro sob o comando de seu irmão Augusto Peixoto em conflitos que ocorreram na região do município de Parati (RJ).
Após a rendição das forças paulistas, foi promovido a capitão-tenente e designado para servir no Norte do País, em missão que visava garantir a neutralidade do Brasil em um conflito entre os países do Peru e da Colômbia.
Em meados do ano de 1933, foi indicado ao cargo de ajudante de ordens da presidência da República por intermédio do então ministro da Marinha Protógenes Guimarães. Também nesse ano, incentivado por seu irmão Augusto – deputado pela Assembleia Constituinte de 1933 –, ingressou na política filiando-se ao Partido Autonomista.
Nos anos seguintes, trabalhou no sentindo de fortalecer seu nome junto de suas futuras bases eleitorais e se envolveu mais diretamente no cenário político carioca, em especial na tumultuada eleição que elegeu Protógenes Guimarães para o governo do Rio de Janeiro. Não obstante, continuou a exercer suas funções de assessoria com o presidente Getúlio Vargas.
Ao final do ano de 1935, com a eclosão da Intentona Comunista, foi um dos primeiros membros do governo a tomar conhecimento dos episódios de revolta. Esteve com Getúlio Vargas em suas visitas aos locais que foram palco dos conflitos.
Ao longo do ano de 1937, o Rio de Janeiro passava por uma séria crise política em razão das sucessivas licenças médicas do então governador Protógenes Guimarães. Em decorrência disso, Getúlio nomeou, com a indicação de José Macedo Soares, Amaral Peixoto para o cargo de interventor federal no estado do Rio de Janeiro.
Na condição de interventor, tomou medidas importantes de cunho fazendário que refundaram o sistema tributário do estado. Nesse período, possibilitou a criação da Caixa Econômica do Rio de Janeiro pelo Governo Federal e uma loteria do estado. Investiu em educação e obteve a concessão de significativos incentivos fiscais para a instalação de indústrias.
Ainda durante o Estado Novo, foi responsável por viabilizar a “Legião Cívica Nacional”, uma organização política de âmbito nacional proposta em fins de maio de 1938, com o objetivo de movimentar a opinião pública e dar origem a um partido político nacional de apoio ao novo regime instituído pela Constituição de 10 de novembro de 1937. Embora tenha contado com a adesão de outros interventores, entre os quais Benedito Valadares (MG), Ademar de Barros (SP), Agamenon Magalhães (PE), Landulfo Alves (BA), José Malcher (PA) e Fenelon Müller (MT), a proposta de criação da Legião Cívica Nacional não chegou a se concretizar.
Em 1939 casou-se com a filha de Getúlio Vargas, Alzira Vargas, e se consolidou como seu mensageiro especial junto do presidente norte-americano Franklin Delano Roosevelt. Embora o Brasil mantivesse boas relações com os países que rivalizam no conflito que se aproximava, Amaral Peixoto sempre se mostrou avesso aos países do Eixo e trabalhou, em parceria com o chanceler Osvaldo Aranha, para que o seu País se alinhasse com os Estados Unidos no conflito.
Durante a Segunda Guerra Mundial, conciliou suas atribuições de interventor com a participação na coordenação de mobilização econômica e como chefe do serviço nacional de abastecimento. Nesse período, tornou-se também presidente de honra do Comitê Interaliado e pouco tempo depois foi aceito na Liga de Defesa Nacional, trabalhando com Juarez Távora na direção da entidade.
Em 1944 o Estado Novo já caminhava para o seu fim, visto que importantes lideranças já realizavam críticas ao governo. Diante do novo cenário, Amaral Peixoto participou ativamente da criação do Partido Social Democrático (PSD) – ao lado de Nereu Ramos, Agamenon Magalhães e outros –, apoiou a candidatura de Eurico Gaspar Dutra para presidente e se tornou um importante interlocutor de Vargas após sua saída da presidência. Em razão da gestão que havia realizado no governo do Rio de Janeiro, era um dos mais importantes articuladores políticos do estado sendo diretamente responsável do relativo sucesso político que seu partido alcançava no período. Posteriormente lutou para mantê-lo aberto em face da ditadura instaurada no Brasil.
Foi eleito para a Constituinte de 1946, e nesta Casa exerceu o papel de defensor de Vargas. Participou das Comissões de Orçamento e de Finanças, que entre seus membros contava com Israel Pinheiro e Aliomar Baleeiro, além da Comissão Mista de investigação da produção agrícola e respectivo financiamento.
Em 1950 foi o candidato eleito a governador pelo Rio de Janeiro na legenda do PSD e participou diretamente das articulações políticas da candidatura de Getúlio Vargas à presidência da República. Mesmo sendo Vargas do PTB, Amaral Peixoto foi um dos membros pessedistas que apoiou Vargas em detrimento do próprio candidato do seu partido, Cristiano Machado.
Durante a crise que precedeu o suicídio de seu genro, atuou no sentido de tentar construir uma saída conciliatória que impedisse uma radicalização nas intenções da oposição em depor o presidente, o que acabou sendo inevitável por conta do clima de aspereza política que predominava. Com a posse de Café Filho, mostrou-se contrário ao novo governo. Mais adiante, apoiou a candidatura vitoriosa de Juscelino Kubitschek à Presidência da República e, com a sua posse em 1956, foi nomeado embaixador do Brasil em Washington.
Ficou neste cargo até 1959, quando pediu exoneração para atuar na condução política do seu partido. Contudo, no mesmo ano foi nomeado para o cargo de ministro da Viação e Obras Públicas, onde deu seguimento a uma política de incentivo à indústria automobilista e de integração nacional por meio do fortalecimento da malha rodoviária.
Ficou no cargo até 1961, quando foi indicado pelo então presidente Jânio Quadros para o cargo de ministro do Tribunal de Contas na vaga surgida pela aposentadoria do ministro Gustavo Capanema. Mesmo na condição de ministro, era eventualmente convocado a intervir nas querelas políticas que caracterizaram o período, especialmente na que foi deflagrada com a renúncia do presidente e a necessidade de garantir a posse de João Goulart.
Foi eleito deputado federal pelo Rio de Janeiro em 1963 com uma votação bastante expressiva, o que o obrigou a se licenciar do seu cargo no TC. Em janeiro do ano seguinte, foi nomeado ministro para assuntos de reforma administrativa no governo Jango. Nesse cargo incumbiu-se de elaborar um projeto de reforma administrativa o qual, ao seu término, foi apresentado ao governo e teve vários pontos transformados em lei.
Com a chegada dos militares ao poder em 1964, manifestou apoio ao nome do presidente Castello Branco em nome de uma transição, mas retirou o apoio absoluto do seu partido diante da cassação dos direitos políticos do ex-presidente JK. Com a instauração do bipartidarismo, transformou-se em um dos fundadores do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) e, em razão da sua longa experiência na vida partidária, foi responsável direto pelo fortalecimento do partido, especialmente no Rio de Janeiro.
No dia 17 de outubro de 1966, aposentou-se do cargo de ministro do Tribunal, recebendo dos seus pares o reconhecimento aos grandes serviços prestados ao País por meio do exercício de suas funções na vida pública, sobretudo na sessão ordinária do dia 19 de outubro de 1966, presidida por Antônio de Freitas Cavalcanti, em que o ministro Rubem Rosa proferiu palavras de despedida para com os seus pares Brochado e Peixoto, que haviam se aposentado, agradecendo os grandes serviços prestados não só à Casa, mas a outros órgãos públicos, por passarem e contribuírem no sentido de edificar a nação brasileira. Por conseguinte, continuou na vida política sendo ainda personagem decisivo em vários episódios do governo militar.
Em relação aos seus mandatos na Câmara Federal, foi reeleito parlamentar em 1966, dessa vez pelo MDB, e em 1969 participou diretamente, com outras grandes lideranças políticas, da tentativa frustrada de buscar uma solução que impedisse o recesso da Câmara estabelecido pelo presidente Costa e Silva. Também integrou as Comissões de Finanças, Orçamento e Relações Exteriores, e presidiu a Comissão de Economia, entre outras.
Foi eleito senador pelo Rio de Janeiro em 1970 com uma votação expressiva, tomando posse em fevereiro do ano seguinte. A essa altura, já havia se consolidado enquanto figura singular na vida pública brasileira, gozando de respeito e prestígio frente a aliados e adversários políticos, como o próprio Filinto Müller, presidente da Arena, que o tratava por “meu chefe”. Nessa época, compôs as Comissões de Agricultura, de Economia e Finanças, bem como presidiu a Comissão de Serviço Público e teve seu término em 1979.
Ao final do seu mandato, foi indicado para ser o representante do MDB no Rio de Janeiro ao Senado, embora já estivesse inclinado a se retirar da vida pública e se manifestasse absolutamente contrário ao instituto do “senador biônico” criado à época. Ao final da eleição de 1978, foi eleito de forma indireta para o Senado e, mesmo seriamente interessado em rejeitar o posto, foi encorajado por seus aliados a aceitá-lo, tornando-se o único senador emedebista “biônico” do País.
Nos anos seguintes, que seriam também do início do processo de redemocratização do País, Amaral Peixoto continuou a estar no centro das negociações políticas, exercendo, inclusive, já em meados da década de 1980, a presidência de seu partido. Um dos últimos capítulos de sua trajetória política se deu em 1986, ao apoiar seu genro Wellington Moreira Franco, do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), na candidatura que o levou ao governo do Rio de Janeiro.
Nesse mesmo ano repassou o controle do partido ao vice-presidente da legenda Jarbas Passarinho. Nos anos seguintes ausentou-se da vida pública, embora eventualmente se manifestasse por meio da imprensa sobre questões políticas da época.
Sua vida foi marcada por intensa participação política, e viva reivindicação contra políticas públicas que não condiziam com sua moral, seus valores, e a expectativas que detinha para o futuro brasileiro. Após uma operação de uma doença no cólon, veio a falecer em 12 de março de 1989, e doou seu arquivo pessoal, suas publicações e documentações ao CPDOC. Durante sua vida foi casado com Alzira Vargas Amaral Peixoto, filha de Getúlio Vargas, e teve uma filha, Celina Vargas Moreira Franco, que ajudou a organizar seus arquivos pessoais e do PSD, trabalhando para o CPDOC. Guarda a sua memória a RJ-106 que recebeu o nome de Rodovia Amaral Peixoto desde a década de 1950, sendo a segunda maior do estado do Rio de Janeiro em extensão, e foi construída durante sua passagem pelo governo do estado, que ligava Niterói à cidade de Campos dos Goytacazes.
Faleceu em 12 de março de 1989.