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TCU sedia debate sobre justiça, paz e direitos humanos
O Tribunal de Contas da União (TCU) sediou o seminário “Diálogos sobre paz, justiça e instituições eficazes: parcerias para o desenvolvimento sustentável”, promovido pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), com o objetivo de discutir os desafios e as oportunidades do Brasil rumo ao alcance do objetivo número 16 da Agenda 2030, que trata da construção de uma sociedade pacífica, justa e inclusiva.
O seminário foi realizado no último dia 19, na sede do TCU em Brasília. A mesa de abertura foi composta pelo presidente do Tribunal, ministro Raimundo Carreiro, o representante-residente do Pnud no Brasil e coordenador-residente da ONU no Brasil, Niky Fabiancic, o secretário-executivo do ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU), José Marcelo Castro de Carvalho, a secretária de Direitos Humanos do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Ivana Farina, e o chefe de gabinete do ministro extraordinário da Segurança Pública, André Giamberardino.
Instituída em setembro de 2015 pelos 193 países membros das Nações Unidas, entre eles, o Brasil, a Agenda 2030 engloba 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e 169 metas que buscam um mundo mais igualitário, mais próspero, mais responsável quanto à gestão dos recursos naturais, mais colaborativo e livre da pobreza, em todas as suas dimensões.
Como o próprio nome indica, o ODS 16 – Paz, Justiça e Instituições Eficazes – é voltado para a superação dos desafios à garantia de paz, acesso à Justiça e promoção de governança e transparência em todas as sociedades. “Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis”, diz a meta da ONU.
Em discurso, Carreiro destacou a oportunidade “ímpar” para debater estratégias destinadas à “efetiva implementação” de um modelo de desenvolvimento sustentável para o Brasil. “Embora esse tema tenha tido bastante destaque nos últimos tempos, ainda é um assunto que carece de maior conscientização da sociedade em geral e, principalmente, de adoção de medidas ousadas e inovadoras, por parte dos órgãos públicos, a fim de alcançarmos a sustentabilidade e o equilibrado tão almejados”, observou.
De acordo com o representante da ONU, Niky Fabiancic, para que os ODS sejam implementados no País, é preciso incorporá-los à realidade brasileira, por isso o Pnud formulou uma pauta de acompanhamento para o período 2017-2021, com base nos cinco eixos que guiam a Agenda 2030: pessoas, planeta, prosperidade, paz e parcerias.
Para o presidente do TCU, além das três dimensões do desenvolvimento sustentável – a econômica, a social e a ambiental – é preciso acrescentar uma quarta: a institucional, “a base para a implementação das demais”. “É nesse ponto que as Entidades de Fiscalização Superiores (EFS) podem trazer grandes contribuições para a melhoria da governança e gestão das instituições e políticas públicas e, consequentemente, para o incremento da qualidade dos serviços públicos prestados aos cidadãos. As EFS são fundamentais para que os governos insiram seus compromissos internacionais de desenvolvimento nas agendas políticas e os persiga com transparência e responsabilidade”, defendeu.
Cooperação institucional
Na mesma direção do presidente Carreiro, a secretária de Direitos Humanos do CNMP defendeu a atuação integrada, ao mesmo tempo em que fez duras críticas à falta de articulação das instituições brasileiras para o cumprimento do ODS 16. “Um dos aspectos mais importantes a justificar essa crise pela qual passa o nosso País, é exatamente a não-integração dos sistemas do Estado Democrático de Direito. Quando o sistema parlamentar ou o de Justiça têm dificuldades em caminhar para metas comuns da democracia, evidentemente que estamos distanciados do que possa ser o melhor para atingir objetivos”, afirmou.
Ivana defende que, para alcançar os objetivos propostos pela Agenda 2030, é preciso pressupor que uma determinada situação “está posta” e, a partir disso, traçar caminhos que levem ao desenvolvimento sustentável. “A situação que está posta merece a reflexão de que o objetivo buscado não tem sido mesmo o do desenvolvimento humano, tendo em vista a violência que evolve toda a nossa sociedade, em números alardeados como o de nações em guerra: 70 mil mortes ao ano, significando cerca de 12% do total mundial. São números que evidentemente demonstram que esse objetivo, o de uma segurança pública que realmente promova a pacificação para uma caminhada de desenvolvimento da sociedade, não é uma situação vivenciada pelo nosso país no momento”, alertou.
Na avaliação de Fabiancic, da ONU, pelas temáticas com as quais trabalha, o ODS 16 demanda “um empenho especial” de trabalho intersetorial. “É preciso a união de esforços do Executivo, do Legislativo e do Judiciário, além da academia, do setor privado e da sociedade civil, para o avanço das pautas de justiça, segurança, governança e transparência”, declarou, ao acrescentar que o Atlas da Violência 2018 mostra que 553 mil pessoas perderam as vidas no Brasil devido à violência, no período que vai de 2006 a 2016. “É um dado assustador, ainda mais quando sabemos que a maior parte dessas pessoas é jovem e negra, pobre e do sexo masculino. Ou seja, a violência alcança, sobretudo, os mais vulneráveis”, destacou.
Segundo ele, anos atrás, o Pnud fez uma pesquisa com 500 mil brasileiros na tentativa de descobrir quais os elementos mais valorizados na promoção do desenvolvimento humano. Ao responder à pergunta “O que precisa mudar no Brasil apara a sua vida melhorar de verdade?”, os entrevistados elencaram três temas principais: segurança, educação e fortalecimento de uma cultura cidadã. “O debate em torno dessas questões continua muito atual”, afirmou.
Como avanços no alcance do ODS 16, Fabiancic citou a Lei de Acesso à Informação, a institucionalização das defensorias públicas nos Estados e a atuação do Ministério Público e demais órgãos de controle. “É preciso fortalecer as ações nesse setor, tanto nas esferas nacionais, quanto subnacionais”, afirmou.
Atuação do TCU
No que tange ao controle externo, o presidente do TCU ressaltou o comprometimento da Corte de Contas com a implementação e o monitoramento dos ODS tanto no Brasil quanto na América Latina, com a adoção de diversas iniciativas. Em relação especificamente ao ODS 16, foco do seminário, Carreiro citou a criação, em 2017, da Secretaria de Relações Institucionais de Controle no Combate à Fraude e Corrupção (Seccor), cuja finalidade é desenvolver, fomentar, monitorar, apoiar e coordenar ações de controle de combate à fraude e corrupção, por meio do fortalecimento da relação entre o Tribunal e os outros órgãos e entidades de controle e fiscalização. “A Seccor, alinhada ao ODS 17 (Parcerias e meios de implementação), busca promover parcerias entre os órgãos de controle e fiscalização no desenvolvimento dos trabalhos voltados para o combate à fraude e à corrupção”, disse.
Carreiro lembrou, ainda, que Tribunal liderou a auditoria coordenada com 11 países da América Latina para avaliar a preparação dos governos para a realização dos ODS. Durante o trabalho, foi desenvolvida uma metodologia para a análise de estruturas de governança com vistas à implementação da Agenda 2030 como um todo e à preparação de uma meta específica, a relativa a sistemas sustentáveis de produção de alimentos.
Além disso, o TCU e os tribunais de contas estaduais vão realizar, neste ano, uma auditoria coordenada para avaliar a gestão de áreas protegidas sob a perspectiva dos ODS. A fiscalização tem por objetivo verificar a implementação de algumas metas dos ODS 14 e 15, bem como as metas da Convenção sobre Diversidade Biológica. O ODS 14 consiste em “conservar e usar sustentavelmente os oceanos, os mares e os recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável”. Já o ODS 15 compreende “proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da terra, e deter a perda de biodiversidade”. No ano que vem, o trabalho envolverá outros países da América Latina e da África.
Governança, Transparência, accountability e participação
“Por que precisamos de governança?”, questionou Cláudio Sarian Altounian, representando o ministro do Tribunal de Contas da União Augusto Nardes, na abertura do primeiro painel da tarde. O painelista do Tribunal alertou para a queda de confiança das instituições brasileiras e apontou para a fragilidade dos mecanismos de governança (liderança, estratégia e controle). Ele citou o Acórdão do TCU nº 1.273, de 2015, que identificou que mais da metade dos órgãos públicos está em um estágio inicial de governança. Cláudio Altounian comentou que a falta de confiança do cidadão no governo é, em grande parte, resultado do baixo nível de governabilidade das instituições, que impede a entrega de bons serviços à sociedade. Para ele, o país tem empregado um foco muito grande no combate à corrupção, mas ainda não percebeu que os resultados da ineficiência, fruto da falta de governança, são ainda mais danosos para a sociedade. “O risco que nós estamos correndo é de darmos muito valor à transparência e esquecer que a sociedade espera resultado. Não adianta dar uma transparência maravilhosa e não entregar produto e valor”, concluiu Cláudio.
O painel contou ainda com as participações de Fernando Filgueiras, diretor de Pesquisa e Pós Graduação da Escola Nacional de Administração Pública (Enap) e Ana Luiza Aranha, da Transparência Internacional. Fernando Filgueiras alertou para os riscos de uma hiper-regulação no Brasil. “Nós somos uma sociedade regida pela desconfiança”. Nesse contexto, os gestores desenvolvem uma aversão ao risco, que impede a inovação; e um descompromisso com as atividades fim. Ana Luiza, comentou que o Brasil avançou nos últimos 15 anos em termos de legislação, mas ainda falta muito para que efetivamente se cumpra a lei, principalmente em nível local. Ela lembrou a importância do pacote de medidas de combate à corrupção, organizado pela Transparência Internacional, em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV). São 70 propostas legislativas e regulatórias construídas com a participação de 373 instituições e 192 especialistas.
Marcelo Barros Gomes, coordenador-geral de Controle Externo de Resultados de Políticas e Programas Públicos do TCU (Coger-Segecex), participou do último painel do seminário “Diálogos sobre Paz, Justiça e Instituições Eficazes: parcerias para o Desenvolvimento Sustentável”. Para ele, a ineficiência das instituições tem consequências drásticas na perpetuação das desigualdades no Brasil e no baixo desenvolvimento econômico e social do país. “As instituições são o que importa se nós quisermos alcançar um patamar mais civilizado no trato com a coisa pública e com a própria cidadania do Brasil”, comenta.
Os próximos passos da agenda ODS no Brasil, de acordo com Marcelo Gomes, passam por seis dimensões nas quais o Tribunal de Contas da União tem tentado contribuir: formação de uma agenda nacional integrada de longo prazo; necessidade de uma governança orçamentária; a importância do desenvolvimento regional e da inclusão socioeconômica do país; a governança multinível; a reforma fiscal e o pacto federativo.
O Tribunal tem participado, segundo Marcelo, de importantes debates para que a agenda ODS seja cumprida, entre eles, o debate sobre a reforma fiscal e o pacto federativo. “Os trabalhos desenvolvidos pelo TCU demonstram a forma como se implicou regiões inteiras do país numa indisciplina fiscal e uma dependência de benefícios, sem uma porta de saída, principalmente na região norte e nordeste. Sem essa discussão séria, vai ser muito difícil o cumprimento da agenda da ONU”, observa.
A Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, da Procuradoria-Geral da República, Deborah Duprat, que também participou do painel de encerramento do seminário, alertou que o Brasil não deve chegar “nem perto” de alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Segundo a procuradora, a emenda do teto de gastos do governo federal é o maior impeditivo. Ela alerta que a experiência vivida em outros países já mostrou que a política de austeridade gera desigualdade, compromete todos os esforços de enfrentamento da pobreza e da miséria e faz com que o ônus da crise recaia quase que exclusivamente sobre os grupos historicamente marginalizados. “Passados dois anos dessa emenda constitucional, nós já podemos identificar o forte impacto que ela teve no tripé que sustenta as políticas de igualdade: educação, saúde e assistência social”, comenta Deborah. Ela acrescenta que “Essa situação de profunda desigualdade histórica, agravada por essas reformas mais recentes, esgarça o tecido social. Ela compromete qualquer projeto coletivo de sociedade.”
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