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Seção das Sessões
Na sessão Plenária do dia 21 de junho, o Tribunal de Contas da União (TCU) apreciou representação autuada com o objetivo de analisar a conduta de agentes públicos e empresas licitantes em irregularidades relacionadas às Concorrências 2/2014 e 1/2015, promovidas pela Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobrás), destinadas à contratação de serviços de apoio técnico, operacional e gerencial, compreendendo, entre outras, as atividades de gerenciamento e fiscalização de obras da fábrica da estatal, em Goiana (PE).
Um dos pontos de discussão referiu-se à possibilidade de o TCU sancionar, por fraude à licitação, empresa que passou por alteração do controle acionário, sem que a nova controladora tivesse conhecimento ou participação nas irregularidades.
Com efeito, entre as irregularidades apontadas, apurou-se a existência de fraude à licitação, decorrente de combinação de preços, quebra de sigilo das propostas (em desconformidade com o art. 3º, § 3º, da Lei 8.666/1993) e apresentação de propostas de cobertura para justificar o preço ofertado.
O relator, ministro Benjamin Zymler, destacou que o processo de due diligence (diligência prévia) realizado pela adquirente do controle acionário, apesar de apontar a existência de operação da Polícia Federal acerca das irregularidades em questão, considerou que os seus possíveis desdobramentos eram de baixo risco de responsabilização da empresa licitante, além de não haver informações suficientes (naquele momento) para se aferir a sua exposição.
A respeito, ponderou que o Tribunal deve sopesar a razoável possibilidade de os novos acionistas controladores serem terceiros de boa-fé, a quem o ordenamento jurídico pátrio confere diversas proteções.
Para o relator, cuida-se de dar concretude ao disposto no art. 20 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), segundo o qual não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão.
Segundo o ministro Benjamin Zymler, não se trata apenas de sopesar os efeitos econômicos da declaração de inidoneidade, mas de examinar qual patrimônio jurídico será efetivamente afetado pela sanção. Nesse sentido, destacou que a empresa adquirente do controle acionário, a maior empreiteira da China, de controle estatal, adotara as cautelas necessárias para a celebração do negócio e agora poderia ser surpreendida com a declaração de inidoneidade da empresa adquirida, em evidente prejuízo ao princípio da segurança jurídica.
O relator lembrou situações em que alterações societárias foram entabuladas com o objetivo de fraudar a pena de declaração de inidoneidade aplicada pelo Tribunal, ressaltando que a finalidade última da pena prevista no art. 46 da Lei Orgânica do TCU é evitar que o Poder Público continue contratando com empresas controladas por pessoas que não reúnam o requisito moral necessário.
No entanto, no caso em apreciação, sustentou que a situação era totalmente distinta, pois, com a troca de comando da empresa licitante, tal objetivo já fora atingido, mas a sanção de inidoneidade, caso aplicada, repercutiria exclusivamente sobre os novos sócios-controladores, que não participaram das irregularidades.
Por fim, argumentou que o leading case em exame, além de prestigiar a segurança jurídica e os direitos de terceiros de boa-fé, inaugura linha de entendimento que melhor se amolda ao interesse público, já que diversos empreendimentos do setor público estão contratados com a empresa, a exemplo da construção da ponte que atravessa a Baía de Todos os Santos, ligando Salvador a Itaparica, com investimentos previstos de R$ 7,2 bilhões.
Ao final, o relator propôs e o Plenário acolheu, por unanimidade, rejeitar as razões de justificativa da empresa licitante, deixando, excepcionalmente, de aplicar a ela a sanção de inidoneidade, em face da perda de objeto ocasionada pela troca do comando societário, ocorrida antes da instauração do processo sancionador.
Para mais informações, a coluna recomenda a leitura do Voto condutor do Acórdão 1.257/2023 – Plenário.